Nau dos Loucos


O Navio dos Loucos ou A Nave dos Loucos é uma pintura do artista holandês Hieronymus Bosch (1450 - 1516), executada em óleo sobre madeira, com 58 cm x 33 cm. Faz parte do acervo do Museu do Louvre, em Paris, aonde chegou em 1918 e é exibida com o título de La Nef des fous. Como as demais obras do autor, carece de uma datação precisa. Alguns especialistas indicam que seja de 1503-1504 (Wundram indica simplemente, que é posterior a 1490). De todo modo, parece claro que se trata de uma obra tardia de Bosch.

A obra critica de forma alegórica, os costumes da sociedade da época: a devassidão e a profanidade presentes em todos os grupos sociais (incluindo o clero, como se pode ver, em primeiro plano, na pintura), o jogo e o álcool. Os protagonistas são uma monja franciscana e um goliardo que se encontram tão distraídos, tentando fincar os dentes num pedaço de comida pendurado por um fio, que nem reparam que ladrões lhes vão roubar o que está sobre a mesa. Há que reparar também no rosto que se encontra no meio da árvore, que provavelmente representa o diabo. Uma das verdades sobre esta obra é de que os três religiosos presentes na obra são Simão, Pedro e Jeová, três cardeais muito importantes naquela época.

A pintura, tal como a conhecemos hoje, é parte de um tríptico que foi cortado em várias partes. A Nave dos Loucos correspondia a um dos painéis do retábulo e atualmente tem cerca de dois terços do comprimento original. O terço inferior do painel pertence à Universidade Yale e é chamado Alegoria da Intemperança. O outro painel remanescente, que manteve aproximadamente o seu comprimento total, é a Morte do Avarento, e se encontra na National Gallery of Art, Washington, DC. Os dois painéis, juntos, representariam os dois extremos da prodigalidades e avareza, condenando e caricaturando ambos.

A obra de Bosch situa-se entre os séculos XV e XVI, época de profunda crise religiosa e social. A pintura flamenga é fiel à tradição religiosa. Na Itália emergiam os princípios do Renascimento, a partir do descobrimento da perspectiva e o conhecimento da anatomia, enquanto nos Países Baixos ainda se conservava uma estética ligada às tradições medievais, conforme atesta a obra de Bosch, marcada pela eterna luta entre o Bem e o Mal.

A nave dos loucos é um tema recorrente nas tradições de Flandres no século XV. De fato, a obra de Bosch encontra suas fontes também na literatura do período. Em 1494, foi publicado na Basileia a obra satírica alemã A nave dos tolos (Stultifera Navis ou Narrenschiff), escrita por Sebastian Brant. 

Em sua simbólica nave, Brant acolhe loucos de todas as categorias e promove um desfile das fraquezas humanas. Uma das estrofes diz: «É melhor seguir sendo laico do que comportar-se mal dentro das ordens». 

Há muitas semelhanças entre o livro e a representação pictórica de Bosch, e é bem possível que o pintor se tenha baseado no poema. Segundo Desmonts), em "Dois primitivos holandeses no Museu do Louvre", o quadro era parte de uma série de pinturas que ilustravam os cantos principais do poema de Brant (Gazette de Beaux-Arts, 1919, p. 1).[1] Na obra de Brant, um grupo de loucos embarca em uma nave para Narragonien, a terra prometida dos insanos, e, antes do naufrágio, chegam a Schlaraffenland, a terra da riqueza.

Também há semelhanças notáveis com o Elogio da loucura, de Erasmo. De fato, a metáfora da barca era uma das mais frequentes na Idade Média. Encontra-se igualmente em Die blau schuÿte ("A barca azul"), de Jacob van Oestvoren.

A relação que Bosch estabelece entre «vício» e «locura» é, portanto, uma constante na literatura do século XV. O artista adverte de forma burlesca sobre a perda dos valores eclesiásticos, a corrupção do clero[1] e a negligência dos homens no tocante à religião, no ocaso da Idade Média. Como escreve Foucault em sua História da Loucura na Idade Clássica (1964), as diversas formas plásticas e literárias nos mostram que, desde o século XV, a face da loucura tem assombrado a imaginação do homem ocidental.

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História da Loucura na Idade Clássica 

História da Loucura na Idade Clássica é um livro de Michel Foucault, originalmente foi publicado como Folie et Déraison pela editora Plon, em 1961, depois como Histoire de la folie à l'âge classique, em 1972, pela editora Gallimard. 

Foi traduzido para o português por José Teixieira Coelho Neto, em 1978. A editora Perspectiva detém os direiros autorais para a língua portugesa. A obra apresenta um estudo, sob a perspectiva arqueológica, das ideias, práticas, instituições, arte e literatura concernentes ao tema da loucura na história ocidental. 

Esta foi a primeira grande obra de Foucault, escrita enquanto ele era diretor da Maison de France na Suécia. Ela resultou de sua tese de doutoramento na Sorbonne. Na primeira versão da editora Plon figurava o famoso prefácio que gerou uma longa discussão acalorada com o filósofo franco-magrebino, Jacques Derrida, a respeito da questão do cogitus de Descartes; em razão disso, o prefácio foi reescrito e apresentado na versão atual que é de 1972.

Foucault começa sua narrativa na Idade Média, detectando a exclusão física-social dos leprosos. Ele argumenta que com a gradativa exclusão dos leprosos, a loucura ocupou essa posição excludente. A nau dos loucos no século XV é um exemplo claro dessa prática: a prática de expulsar os loucos dos navios. Entretanto, durante a Renascença, a loucura foi tratada como um fenômeno corriqueiro porque os homens não podiam entender por completo as Razões de Deus. Miguel de Cervantes em Dom Quixote, por exemplo, retrata os homens como fracos ante a seus desejos e dissimulações. 

Portanto, o louco, entendido como aquele que chegou próximo demais a Razão de Deus, era aceito no meio social. Somente depois do século XVII, num movimento que Foucault descreve como o Grande Confinamento, esses membros "irracionais" da população começaram a ser presos e institucionalizados. No século XVIII, a loucura passou a ser encarada como o oposto da Razão, pois muitos homens assumiam o comportamento de animais e, portanto, deveriam ser tratados como tais. A partir do século XIX, a loucura é vista como doença mental que deve ser tratada. Alguns historiadores argumentam que o grande confinamento dos loucos não ocorreu no século XVII, mas no século XIX.

Entretanto, os estudiosos da obra de Foucault demonstram que ele não se referiu a instituições médicas dedicadas exclusivamente a tratar os insanos; e que o pensamento presente nessas casas de confinamento é o mesmo da sociedade ocidental. Mais adiante, Foucault demonstra que a "grande Internação" social foi um fenômeno europeu generalizado, o qual se desenvolveu de maneira singular na França e de modo comum nos outros países, como no caso da Alemanha e Inglaterra. 

Foucault também argumenta que, durante a Renascença, a loucura tinha o poder de impor uma ordem social bem como a capacidade de apontar para um verdade mais esclarecedora e profunda. Isso foi silenciado pela Razão do Esclarecimento. Ele também examina o surgimento da sociedade moderna e os tratamentos "humanitários" para o louco, como por exemplo no caso de Philip Pinel e Samuel Tuke. Foucault afirma que tais tratamentos não mais controlavam os métodos aos quais se propunham. 

O tratamento de Tuke consistia em punir os loucos até que eles não mais desenvolvessem sua loucura. Similarmente, o tratamento de Pinel consistia numa extensa terapia de aversão, o que incluía métodos como banho de água fria e jaqueta de força. Na visão de Foucault, esse tratamento somado a repetida brutalidade traria ao paciente a internalização de julgamento e punição.

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